Teoria Geral dos Planímetros
João Nuno Tavares

Planímetros
 

Planímetros são instrumentos que servem para medir uma área plana, limitada por uma curva fechada $ {\mathscr{C}}$, que, por simplicidade, supômos que não se auto-intersecta.

O orgão principal, comum a todos os planímetros que vamos estudar, consiste de uma barra de comprimento fixo, que se desloca continuamente no plano, "varrendo" uma certa área algébrica que, por um processo apropriado, conduz à medição da área pretendida. Vejamos com detalhe o que isto significa.

Para além da curva $ {\mathscr{C}}$, que delimita a área que pretendemos medir, consideremos uma outra curva $ {\mathscr{D}}$, e uma barra $ DC$ de comprimento fixo $ \ell$, que se desloca continuamente no plano, de tal forma que, durante o movimento, $ D$ e $ C$ permanecem sempre em $ {\mathscr{D}}$ e $ {\mathscr{C}}$, respectivamente.

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A curva $ {\mathscr{D}}$ chamar-se-á a curva directriz e o ponto $ C$ o traçador da curva $ {\mathscr{C}}$.

Um dos planímetros mais conhecidos é o planímetro polar de Amsler, em que a directriz $ {\mathscr{D}}$ é uma circunferência:



Áreas Algébricas

Para explicarmos como funciona um planímetro, vamos começar por determinar uma fórmula para a área (algébrica) varrida pela barra $ DC$, quando esta se desloca de $ DC$ para uma posição "muito próxima" $ D'C'$.

Mas antes, vejamos qual o significado de área algébrica. Para isso, vamos supôr que a barra $ DC$ está orientada (de $ D$ para $ C$). A área varrida por essa barra é então algébrica no sentido em que ela será afectada por um sinal $ +$ ou $ -$, conforme a orientação do seu bordo for positiva (sentido anti-horário) ou negativa.

Na figura 1, onde representámos as áreas positivas pela côr azul e as negativas pela côr vermelha, ilustrámos as várias posições possíveis para $ DC$ e $ D'C'$.




Deslocamentos
elementares

O deslocamento da barra, da posição $ DC$ para a posição "muito próxima" $ D'C'$, pode ser vista como uma sequência de três deslocamentos elementares que passamos a analisar:



  • $ \bf [E1]$. a barra desloca-se paralelamente a si própria, de $ DC$ para $ D_1C_1$, varrendo a área (algébrica) de um rectângulo de altura $ dh=\overline {DD_1}$. A área varrida é então igual a:
    $\displaystyle dS=\ell\, dh$

    Nesta fórmula, $ dh$ terá o sinal da área algébrica do rectângulo referido.

  • $ \bf [E2]$. a barra desliza segundo a sua própria direcção de $ D_1C_1$ para $ D_2C_2$, varrendo uma área nula.
  • $ \bf [E3]$. A barra roda em torno do ponto $ D_2=D'$ de um ângulo igual a $ d{ \alpha}$, varrendo a área do sector circular $ C_2D'C'$ que é igual a:
    $\displaystyle dS=\frac{\ell^2}{2}\, d{ \alpha}$
    Nesta fórmula, $ d{ \alpha}$ terá o sinal da área algébrica do sector circular referido.


Fórmula
fundamental

Sobrepondo os três deslocamentos elementares, obtemos para a área algébrica elementar $ dS$, varrida pela barra $ DC$, quando esta se desloca de $ DC$ para uma posição "muito próxima" $ D'C'$, a fórmula fundamental seguinte:

$\displaystyle \framebox{$\, dS= \ell\, dh+ \frac{\ell^2}{2}\, d{ \alpha}\,$}$ (1)

Nota:  na figura 2, está representado o caso em que $ dh$ e $ d{ \alpha}$ são ambos positivos. Nas figuras seguintes ilustram-se outras situações possíveis:


Figura: $ dh$ < 0 e $ d{ \alpha}$ > 0

Figura: $ dh$ > 0 e $ d{ \alpha}$ < 0



Barra com
roleta

Suponhamos agora que na barra $ DC$ está colocada uma pequena roda (roleta) de raio $ r$, cujo eixo é a barra $ DC$, e cujo plano de simetria, perpendicular à barra, passa no ponto $ R$. Quando a barra se move, a roleta roda em torno do seu eixo, de acordo com uma certa lei, e um contador regista o número de voltas (e fracções de volta) que ela dá.


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Para os deslocamentos elementares de $ DC$ para $ D'C'$, considerados anteriormente, o comprimento do arco elementar $ ds$, percorrido pelo ponto de contacto da roleta com o plano, ou, de forma equivalente, o comprimento do arco $ ds$, percorrido pelo ponto $ R$, é claramente igual a:

$\displaystyle ds=dh+\overline {DR}\times d{ \alpha}$ (2)

onde a distância $ \overline {DR}$ tem sinal $ +$, se $ R$ está entre $ D$ e $ C$, e sinal $ -$, se $ R$ está antes de $ D$, relativamente à orientação da barra $ DC$.

As duas parcelas provêm dos deslocamentos elementares $ \bf [E1]$ e $ \bf [E3]$, respectivamente. Desprezamos o arco percorrido por $ R$ no deslocamento elementar $ \bf [E2]$, uma vez que este não produz nem área nem rotação da roleta.



Figura: Deslocamentos elementares da barra com roleta

Daqui se deduz que $ dh=ds-\overline {DR}\times d{ \alpha}$ e, substituindo na fórmula (1), obtemos:

$\displaystyle dS= \ell\, (ds-\overline {DR}\times d{ \alpha}) + \frac{\ell^2}{2}\, d{ \alpha}$
ou ainda:
$\displaystyle \framebox{$\, dS= \ell\, ds +
 \left(\frac{\ell^2}{2}-\overline {DR}\times\ell \right)\, d{ \alpha}\,$}$ (3)


Movimento contínuo

Para calcular a área varrida pela barra, quando esta se desloca continuamente de uma posição $ D_0C_0$ para uma outra posição $ D_1C_1$, decompômos esse movimento numa sequência de movimentos infinitamente próximos, aos quais aplicamos a análise anterior.

Se $ S$ designa a área varrida pela barra quando esta se desloca de $ D_0C_0$ para $ DC$, e se $ DC$ sofre um pequeno movimento que a desloca até $ D'C'$, a área sofre um acréscimo elementar $ dS$, dado pela fórmula (3). Para ter a área total, somamos todas estas contribuições, isto é, integramos o segundo membro de (3) desde a posição $ D_0C_0$ até à posição $ D_1C_1$. Desta forma, obtemos:

$\displaystyle \framebox{$\, {\hbox{\'area}}(D_0C_0D_1C_1)= \ell\, s +
 \left(\frac{1}{2}\ell^2-\overline {DR}\times\ell\right)\, ({ \alpha}_1-{ \alpha}_0)\,$}$ (4)

onde $ s$ designa o arco total percorrido pelo ponto de contacto da roleta com o plano, e $ { \alpha}_0,{ \alpha}_1$ representam, respectivamente, os ângulos das posições $ D_0C_0$ e $ D_1C_1$ com o eixo horizontal, como se ilustra na figura seguinte.



O arco total $ s$ pode ler-se num contador que regista o número de voltas e fracções de volta da roleta. O ângulo $ { \alpha}_1-{ \alpha}_0$ é o ângulo das duas posições extremas da barra.


Área de um
contorno fechado

Suponhamos agora queremos medir a área $ {\mathscr{A}}({\mathscr{C}})$, limitada por uma curva simples fechada $ {\mathscr{C}}$ (orientada positivamente), e suponhamos ainda que a directriz $ {\mathscr{D}}$ não intersecta a área a medir, como na figura seguinte.





A medição da área faz-se então, muito simplesmente, fazendo o traçador $ C$ pecorrer a curva $ {\mathscr{C}}$, uma única vez no sentido positivo. Após essa volta, a barra $ DC$ regressa pois à sua posição inicial. Se, além disso (e este é um ponto essencial!), o ponto $ D$ faz apenas um movimento de ida e volta sobre $ {\mathscr{D}}$, de tal forma que a barra não roda sobre si própria, então ter-se-á que:
$\displaystyle { \alpha}_1-{ \alpha}_0=0$
Sendo assim, a segunda parcela da soma, no segundo membro da fórmula (4), anula-se, e a área $ {\mathscr{A}}({\mathscr{C}})$ é dada por:
$\displaystyle {\mathscr{A}}({\mathscr{C}})=\ell\times s$ (5)


Planímetro

Linear


Para ilustrar de imediato como isto se processa, observemos o applet seguinte, onde se ilustra um planímetro linear, em que a directriz $ {\mathscr{D}}$ é uma linha recta.


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Para animar este applet, deve clicar sucessivamente nos botões de animação pela ordem indicada. Se pretender repetir a visualização faça "reload" para obter a configuração inicial.

As áreas varridas pela barra nas quatro primeiras animações são positivas (azuis), e as varridas nas três últimas é negativa (vermelha). Observe bem o cancelamento das áreas positivas e negativas para que o resultado final seja apenas a área $ {\mathscr{A}}({\mathscr{C}})$ que se pretende medir!...


Finalmente
a medição

Retomemos a fórmula (5) para a área $ {\mathscr{A}}({\mathscr{C}})$, obtida sob a hipótese de que a barra $ DC$ não roda sob si própria (não esqueça...):

$\displaystyle {\mathscr{A}}({\mathscr{C}})=\ell\times s$
Como o arco $ s$ percorrido pelo ponto de contacto $ R$ da roleta com o plano é dado por:

$\displaystyle s$ $\displaystyle =$ $\displaystyle \hbox{per{\'\i}metro da
roleta}\times\hbox{n\'umero de voltas}$  
  $\displaystyle =$ $\displaystyle 2\pi r\times n$ (6)

($ n$ representa o número de voltas, ou frações de volta, que a roleta faz), a área $ {\mathscr{A}}({\mathscr{C}})$ é dada por:

$\displaystyle {\mathscr{A}}({\mathscr{C}})=2\pi r\ell n$
Portanto, se construirmos o planímetro de tal forma que:
 
$\displaystyle 2\pi r\ell=1$
vem finalmente que:
$\displaystyle {\mathscr{A}}({\mathscr{C}})=n$ (7)

Se o planímetro dispuser de um contador de voltas da roleta, a área $ {\mathscr{A}}({\mathscr{C}})$ lê-se directamente nesse contador.

Nos dois planímetros mais conhecidos, a curva directriz $ {\mathscr{D}}$ tem a forma de uma circunferência, no planímetro de Amsler, e de uma recta, no planímetro linear. Este último já foi analisado e ilustrado num applet anterior.

No planímetro de Amsler, o ponto $ D$ da barra é obrigado a percorrer um arco de circunferência, recorrendo a uma outra barra $ OA$ de comprimento igual ao raio dessa circunferência.

No applet seguinte, com a ajuda do rato, faça $ C$ percorrer uma única vez (no sentido anti-horário) a curva $ {\mathscr{C}}$, para ter uma ideia de como funciona o planímetro de Amsler. É claro que deve imaginar a roleta a rolar...

Por favor habilite Java para uma construção interativa (com Cinderella).

Quando a curva $ {\mathscr{C}}$ é muito grande relativamente às dimensões do aparelho, podemos colocar a circunferência directriz $ {\mathscr{D}}$, no interior de $ {\mathscr{C}}$, como se ilustra no applet seguinte.


APPLET CINDERELLA (em construção)



Quando fazemos o traçador $ C$ percorrer uma única vez (no sentido anti-horário) a curva $ {\mathscr{C}}$, a área varrida pela barra $ DC$ é a área da coroa compreendida entre a circunferência e a curva $ {\mathscr{C}}$. Agora acontece que a barra dá uma volta sobre si própria e portanto:
$\displaystyle { \alpha}_1-{ \alpha}_0=2\pi$
Daí que, aplicando a fórmula (4), se obtenha desta vez:

$\displaystyle \hbox{\'Area da coroa}=\ell \,
 s+\left(\frac{1}{2}\ell^2-\overline {DR}\times\ell\right)\,2\pi$ (8)

isto é:

$\displaystyle S={\mathscr{A}}({\mathscr{C}})=\ell\,s+\left(\frac{1}{2}\ell^2-\overline {DR}\times\ell\right)\,2\pi+\pi\overline {OD}^2$ (9)

A quantidade:

$\displaystyle \ell\,s=2\pi r\ell n$
é, como antes, lida no contador de voltas. A quantidade:
$\displaystyle \left(\frac{1}{2}\ell^2-\overline {DR}\times\ell\right)\,2\pi+\pi\overline {OD}^2$
é uma constante que pode ser ajustada dimensionando convenientemente as componentes do aparelho.




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Joao Nuno Tavares 2005-03-22