História e Epistemologia da Matemática - 2002/03

António Machiavelo


Coisas que se escrevem...
"Para além dos inteiros, os Egípcios concebem apenas fracções unitárias...
Enfim, recusando-se a admitir fracções para além das unitárias..."

(Amy Dahan-Dalmedico & Jeanne Peiffer, Une Histoire des Mathématiques: routes et dédales, Éditions du Seuil, 1986, pp. 14-15)

"Os Egípcios lidavam apenas com fracções unitárias..., com a única excepção de 2/3..."

(Victor J. Katz, A History of Mathematics: an introduction, HarperCollins 1993, p. 9)



Opiniões sobre a matemática egípcia...



"O que nós não sabemos, porque os documentos não nos dizem, é como os escribas egípcios descobriram os métodos que usaram. Se eles simplesmente fizeram uma suposição correcta, então podíamos dizer que não tinham uma matemática «científica». Mas se eles usaram alguma forma de argumento - não necessariamente um argumento baseado num raciocínio lógico estrito a partir de axiomas explícitos - eu penso que se deve concluir que a sua matemática tinha um suporte ««científico»."

(V. Katz, 1996, em  Actas do HEM, APM 1, p. 51)

"Um argumento não simbólico pode ser rigoroso, mesmo quando dado para um valor particular da variável; as condições para o rigor são que o valor particular da variável seja  típico e que uma generalização posterior para  qualquer valor seja imediata."

(Gillings, 1982, p. 233)

"Um estudo cuidadoso do papiro Rhind convenceu-me há alguns anos que este trabalho não é uma mera colecção de problemas práticos especialmente úteis para medir as terras, e que os egípcios não eram uma nação de lojistas interessados apenas naquilo que podiam utilizar. Em vez disso eu creio que eles estudaram matemática e outros assuntos pelo seu próprio gosto."

(A. B. Chace, tradutor e editor do Papiro de Rhind, 1927)

"Todos os  textos disponíveis evidenciam uma matemática egípcia de objectivos muito limitados, embora com alguma sofisticação dentro desses limites."

(Struik, 1997, p. 56)

"A verdade é que as matemáticas egípcias permaneceram num nível demasiado baixo para contribuírem com alguma coisa de valor. As dificuldades de cálculo com um tão rudimentar sistema de numeração e métodos primitivos impediram qualquer avanço ou interesse em desenvolver a ciência pelo seu próprio gosto... O seu interesse para nós reside no seu carácter primitivo, e naquilo que revela acerca das mentes dos seus criadores e utilisadores, e não na sua influência histórica."

(G. J. Toomer, historiador da matemática, 1971
em "Mathematics and Astronomy" in J. R. Harris (ed.), The Legacy of Egypt, Oxford, 1971, pp. 37-40, 45
)



A opinião dos Gregos...


"Para além disso, o Rei (dizem eles) dividiu o país por todos os egípcios, dando-lhes igual porção de terras, e fez disto a sua principal fonte de  receitas, fixando uma taxa anual. E todo aquele a quem o rio roubasse uma parte da sua terra iria ter com Sesostris [12ª dinastia, 1991-1783 a.C.] e declarava o que lhe tinha acontecido; o rei enviava então homens para o local e medir o a porção de terra que tinha diminuído, para que depois a taxa fosse paga na respectiva proporção. Daqui, na minha opinião, os Gregos aprenderam a arte da geometria..."

(Heródoto, meados do século V a.C.)

"Por isso foi depois de todas essas invenções [das artes práticas] estarem feitas que aquelas das ciências que não são direccionadas para a obtenção de prazer [conforto?] ou para a satisfação das necessidades da vida  foram descobertas; e isto aconteceu em locais onde os homens tinham lazer. É por isto que as artes matemáticas foram iniciadas no Egipto; pois aí havia uma casta sacerdotal à qual era permitido gozar de lazer."

(Aristóteles, meados do século IV a. C.)

"Tales [c.624-c.547 a.C.] foi primeiro para o Egipto e daí introduziu este estudo [geometria] na Grécia."

(Proclus, Comentários sobre Euclides, século V,
in Heath, A History of Greek Mathematics, p. 128 )

"Tales, admirando as suas [de Pitágoras] notáveis capacidades, comunicou-lhe tudo o que sabia, mas, por causa da idade e de se sentir enfraquecido, aconselhou-o a que, para sua melhor instrução, fosse e estudasse com os sacerdotes egípcios. Pitágoras, visitando Sídon pelo caminho, por ser a sua terra natal e porque pensou que a passagem para o Egipto seria mais fácil por essa rota, associou-se aí com os descendentes de Mochus, o filósofo natural e profeta, e com os outros hierofantes, e foi iniciado em todos os ritos praticados em Biblos, Tiro, e em muitas partes da Síria, práticas a que ele se submeteu, não por entusiasmo religioso, como se possa pensar, mas muito mais por amor e desejo de pesquisa filosófica, e de modo a se assegurar que não deixava passar nenhum fragmento de conhecimento que valesse a pena adquirir, e que pudesse estar escondido nos mistérios e cerimónias do culto divino; então, percebendo que aquilo que encontrou na Fenícia era de algum modo derivado ou descendente da sabedoria dos sacerdotes egípcios, concluiu que adquiriria um conhecimento mais puro e mais sublime indo à fonte, no próprio Egipto.
Aí, estudou com os sacerdotes e profetas e instruiu-se  em todos os tópicos possíveis, não neglicenciando nenhum assunto que fosse indicado pelos melhores juízes; nenhum indivíduo entre aqueles que fossem famosos pelos seus conhecimentos; nenhum ritual praticado no país, fosse onde fosse; e não deixando nenhum lugar por explorar onde ele pensasse que poderia descobrir algo mais....
E assim passou 22 anos nos santuários por todo o Egipto, dedicando-se à Astronomia e à Geometria, entrando em todos os rituais de veneração divina, até ter sido feito prisioneiro pelas tropas de Cambyses e ser levado para Babilónia, onde novamente se associou com os Magos, um aluno disposto a aprender entre mestres dispostos a ensinar. Por eles foi instruído nos seus rituais solenes e cultos religioso, e no seu meio atingiu a mais alta eminência na Aritmética, Música, e nos outros ramos do Saber. Após 12 anos mais, assim passados, regressou a Samos, tendo então cerca de 56 anos de idade."

(Jamblico, Da Vida Pitagórica, início do século III,
in Heath, A History of Greek Mathematics, pp. 4-5)

"Crianças que nascem livres deviam aprender tanto destas coisas quanto as vastas multidões de jovens no Egipto o fazem com o seu alfabeto. Em primeiro lugar, no que diz respeito à aritmética, aulas foram aí elaboradas para puros principiantes com base na diversão e no jogo, distribuindo maças e grinaldas de tal modo que os mesmos números sejam distribuídos entre grupos maiores e grupos menores...Os professores, aplicando as regras e práticas da aritmética às brincadeiras, preparam os seus alunos para as tarefas de ordenar e de comandar exércitos, de organizar expedições militares, assim como  governar uma casa, e assim os formam como pessoas mais úteis para elas próprias e para os outros, e um bom bocado mais despertas."

(Platão, Leis 7, 819 [início do século IV a.C.]
in Robins & Schute...)

"..."