COMO DESENHAR UMA LINHA RECTA
COM
MECANISMOS ARTICULADOS PLANOS
(segundo Kempe)
Born:
6 July 1849 in Kensington,
London, England
Died: 21 April 1922 in London,
England
O grande geómetra Euclides, antes de demonstrar várias proposições contidas na sua obra Elementos de Geometria, pressupõe que sejamos capazes de efectuar certas construções preliminares. Estes requisitos iniciais, agora denominados Postulados, envolvem, em particular, a suposta possibilidade de construirmos linhas rectas e círculos. É tão grande a veneração prestada a este mestre-geómetra, que, em geral, todos recusariam a designação de “geométrica” a uma demonstração que não pudesse ser efectuada apenas com o recurso a linhas rectas e círculos. Consequentemente muitos problemas - tal como, por exemplo, a trissecção de um ângulo - que podem facilmente ser resolvidos por outros processos simples, segundo Euclides, não têm uma solução geométrica, já que não podem ser resolvidos apenas com linhas rectas e círculos.
Relativamente ao círculo não encontramos dificuldades. Atendendo às definições de Euclides, e supondo que a superfície na qual desejamos descrever o círculo é um plano, vemos que basta que o marcador preserve a distância (igual ao raio requerido) ao centro dado do círculo. Isto pode imediatamente ser conseguido tomando uma peça plana de qualquer forma, tal como uma peça de cartão, passando o pivot (pequeno eixo), que está fixado à superfície dada, no centro dado através dum furo na peça, e o marcador (ou lápis) por entre outro furo nessa mesma peça, com uma distância ao primeiro furo igual ao raio dado; podemos então, movendo o lápis, mesmo com este rude aparelho, descrever um círculo com considerável precisão e facilidade; e quando os furos e pivots forem muito pequenos, ou mesmo grandes, desde que efectuados com a maravilhosa precisão que o torno mecânico já permite obter, devemos obter um resultado incomparável pela suavidade e precisão dos seus movimentos. O aparelho que acabamos de descrever é evidentemente um simples compasso, e é usual dizer-se que o terceiro Postulado postula a existência de compassos.
Esperámos que, neste momento, seja bem clara a diferença entre o método que adoptámos há pouco, para descrever um círculo, e o método da régua para descrever uma linha recta. Se aplicarmos o método da régua na descrição do círculo, devemos tomar uma lâmina (chapa) circular, por exemplo uma moeda, traçando o círculo passando um lápis em volta do bordo. No entanto, encontrámos de novo as mesmas dificuldades de há pouco, visto que primeiramente temos que fazer a lâmina em forma circular !
Por outro lado, no outro método que aplicámos para o círculo, não assumimos previamente que temos um círculo que depois usámos para traçar um outro - simplesmente exigimos que a distância entre dois pontos seja invariável. Estámos naturalmente cientes que aplicámos círculos no nosso compasso simples, o pivot e o furo na peça móvel são disso exemplos; mas os círculos são usados, não por serem as curvas que queremos descrever (estas são de diferente tamanho), tal como o caso da aresta recta, mas devido à impossibilidade de construir pivots ou furos de dimensão nula, somos forçados a adoptar o melhor substituto possível para fazer com que um ponto na peça articulada fique no mesmo sítio. Se usarmos pivots e furos muito pequenos, embora eles não sejam verdadeiramente circulares, o erro na descrição do círculo, em dimensões moderadas, será praticamente infinitesimal, não excedendo talvez a largura da linha mais fina que o marcador possa descrever; e, mesmo quando aplicamos grandes pivots e furos, devemos obter resultados com precisão, já que esses pivots e furos podem ser feitos usando outros de dimensões muito pequenas, na máquina que os constrói.
Parece portanto que, embora tenhámos um método fácil e preciso para descrever um círculo, não temos, à primeira vista, um método correspondente para descrever uma linha recta; ora isto representaria uma enorme lacuna – não sabermos construir logo aquela que, para os matemáticos, é a curva mais simples! Assim, superar tamanha dificuldade tornou-se um objectivo de claro interesse teórico.
Mas esta não é uma questão apenas de interesse teórico, pois é óbvia a sua grande importância prática no fabrico de mecanismos. De facto, num grande número de máquinas e aparelhos científicos é necessário que algum ponto ou pontos devam mover-se com precisão segundo uma linha recta, com a mínima fricção (atrito) possível. Se adoptarmos o “princípio da régua”, e o ponto fôr mantido na sua trajectória através de guias, teremos o desgaste, com eventual ruptura, produzido pela fricção das superfícies de deslizamento e ainda a deformação produzida por mudanças de temperatura e variação de tensões, isto, é claro, para além da dificuldade inicial de fazer as guias verdadeiramente rectas! Por conseguinte, torna-se realmente necessário obter algum método que não envolva estas características desagradáveis, mas que possua a precisão e facilidade do movimento que caracterizam o nosso aparelho para a construção do círculo.
Figura 1
Se as peças radiais forem suficientemente grandes, o marcador descreve círculos ou porções de círculos nelas próprias; contudo elas estão em movimento, com a mesma mobilidade e precisão, tal como no caso do aparelho simples para desenhar círculos; no entanto, agora o marcador não descreverá um círculo na superfície fixa, mas sim uma curva complicada.
Esta curva, será descrita todavia, com toda a facilidade e precisão com que eram descritos os círculos, e se quisermos reproduzir num segundo aparelho as curvas que produzimos com este, temos apenas de respeitar as distâncias entre os pivots e o marcador. As curvas serão precisamente as mesmas, em ambos os casos. Poderíamos, naturalmente, ir acrescentando novas peças ad libitum, conseguindo desta forma descrever muitas curvas complicadas, embora com resultados idênticos de precisão e suavidade – assim, a reprodução de qualquer curva particular, dependerá unicamente da correcta determinação de um certo número definido de distâncias.
A estes sistemas, constituídos por peças articuladas entre si e por pivots ligando essas peças a uma base fixa, de tal forma que os vários pontos nessas peças descrevem curvas definidas, chamámos “sistemas articulados”; às peças chamámos “barras”. Por vezes tem interesse considerar esses sistemas independentemente da forma como se encontram articulados à superfície fixa. Nesse caso designá-los-emos por “mecanismos planos”. Estes podem ser rodados de forma arbitrária relativamente à base fixa. A curva descrita pelo marcador de um sistema articulado designa-se por “traço “ (3).
As propriedades destes mecanismos planos têm atraído a atenção dos matemáticos durante os últimos anos e é um tema muito complexo e difícil. Apesar de ser possível a análise puramente matemática da questão, vamos restringir a nossa atenção aos resultados práticos que alguns matemáticos obtiveram. Aliás, acreditámos que tais resultados só poderiam ser mesmo obtidos por matemáticos! Não resta qualquer dúvida àcerca da valia desses resultados, embora a sua grande beleza possa ter exacerbado a importância que eles de facto não têm. Pode ser que, hà 50 anos atrás, eles tenham tido um valor que, entretanto, deixaram de ter devido aos sucessos conseguidos pela mecânica moderna na construção de réguas e outras estruturas exactas.
Os resultados práticos obtidos pelo uso dos mecanismos
planos
são, apesar de em número reduzido, estritamente
relacionados com o problema do movimento rectilíneo, e, de
facto, foram obtidos durante a investigação desse
problema. Portanto, somos levados naturalmente a considerar o movimento
rectilíneo como a essência do nosso estudo. Mas, antes de
nos debruçamos sobre esses mecanismos, é útil
imaginar como poderemos construir, na prática, tais modelos; e
aqui está uma das grandes vantagens do nosso tema - podermos
visualizar com toda a facilidade tais resultados diante de nós.
Alfinetes para os pivots fixos, cartões para as barras, corda ou
algodão
para os restantes pivots e uma mesa para a base fixa, é tudo o
precisamos.
Se for pretendido algo mais artístico, podemos utilizar os
modelos
exibidos, na Loan Collection. Os modelos foram construídos por
H.R.Kempe,
da seguinte maneira. As bases são placas estreitas pintadas de
preto;
as barras são primorosamente construídas com
cartões
espessos; os pivots são pequenos pregos feitos de corda, sendo
as
cabeças dos pregos feitas pressionando a face de um cinzel de
metal
quente nos extremos da corda, após esta ter passado
através
dos buracos dos pivots; isto produz uma macia e firme junta de
trabalho.
Pivots mais duradouros podem ser feitos de folha-de-flandres; fura-se a
folha-de-flandres para se obter os buracos dos pivots e utiliza-se
ilhós
de sapatos para os pivots. Pode adquirir-se os utensílios
referidos,
economicamente, em qualquer drogaria.
As curvas descritas por pontos escolhidos nestes mecanismos são, em geral, muito complexas. Mas poderemos obter curvas simples, se escolhermos adequadamente as distâncias entre os pivots. Existirá algum ponto, de alguma barra, que descreva uma linha recta? Isto é o que vamos investigar.
Com uma única barra é visivelmente impossível, pois todos os pontos da barra descrevem círculos. Consideremos então uma estrutura de três barras. Neste caso teremos de escolher seis distâncias: a distância entre os pivots fixos, CD, as distâncias entre os pivots nas barras radiais, BD e AC, a distância entre os pivots nas barras transversais, AB, e a distância entre o marcador e os pivots nas barras transversais, AP e BP (P é o marcador) (ver a figura 2). Podemos escolher tais distâncias, de modo que o nosso traçado seja uma linha recta?
A primeira pessoa que investigou isto foi James Watt. O “Movimento Paralelo de Watt” (4), inventado em 1784, é conhecido por qualquer engenheiro e é utilizado em quase todas as máquinas a vapor. Um modelo deste sistema articulado está ilustrado na figura 2, na sua forma mais simples.
Para muitas aplicações, a “linha recta” obtida pelo mecanismo de Watt, é perfeitamente satisfatória, mas, se for necessária uma linha recta exacta, temos que insistir nas nossas tentativas. De facto, é possível provar que é impossível resolver o problema com uma estrutura de três barras. Existem melhores aproximações de linhas rectas do que as dadas por Watt.
As barras radiais, AB e CD, são de igual comprimento, a distância entre os pivots fixos, AD, é o dobro da distância entre os pivots na parte transversal, BC, e o marcador dista dos pivots o mesmo comprimento das barras radiais. Consequentemente, o marcador traça aproximadamente a linha recta que se obtém unindo os pivots fixos, coincidindo com esses mesmos pivots e com o ponto médio entre eles. Contudo, não coincide em quaisquer outros pontos, desviando-se ligeiramente entre os pivots fixos. A trajectória descrita pelo marcador, depois de passar pelos pivots fixos, desvia-se da linha recta.
2.
Traçado exacto de
uma linha recta. O mecanismo de Peaucellier
Falhámos então com 3 barras, e temos de continuar com o próximo caso, um mecanismos com 5 barras – observemos que precisamos de um número ímpar de barras se queremos um aparelho que descreva determinadas curvas. Será que conseguimos resolver o problema com 5? Podemos, de facto! Mas este não foi o primeiro movimento exacto descoberto, e temos de dar ao seu primeiro autor o respectivo mérito (se bem que ele não tenha descoberto o modo mais simples) e prosseguir por ordem cronológica estrita.
Em 1864, oito anos após a descoberta de Watt, o problema foi resolvido pela primeira vez por M. Peaucellier, um oficial de Engenharia da armada francesa. À sua descoberta não foi inicialmente dado o seu real valor, tendo caído quase no esquecimento, até ter sido redescoberta por um estudante russo chamado Lipkin, que recebeu um prémio substancial do Governo Russo pela sua suposta originalidade. Entretanto, o mérito de M. Peaucellier foi finalmente reconhecido, tendo sido galarduado com o prémio de grande mecânico do Instituto de França, o “Prix Montyon”.
O aparelho de M. Peaucellier está representado na figura 5.
Figura
5.
Mecanismo de Peaucellier
(ver relatório
da
construção pdf)
Tem, como se pode ver, sete barras. Existem antes de mais duas barras de igual comprimento (OA=OB). Estas estão ambas articuladas no mesmo ponto fixo O; as suas outras extremidades, A e B, estão articuladas em ângulos opostos de um losango ACBP composto por 4 barras iguais e de comprimento inferior às barras OA e OB. A porção do aparelho que descrevi até agora, considerada ignorando a base fixa, é um sistema articulado denominado “célula de Peaucellier”. Pegámos então numa barra extra, QC, e articulámo-la a um ponto fixo, Q, tal que QC=QO; a outra extremidade desta barra extra está então articulada a um dos ângulos livres do losango, C; o outro ângulo livre do losango, P, tem um marcador no seu pivot, que vai descrever uma linha recta exacta.
ou ainda:
É também claro que se tomarmos o ponto P´, do outro lado de O, e se OC . OP´ é constante, P´ vai descrever a linha recta P´M´. Isto vai ser importante.
AO² = On² + An²
AO²
– AP² = On²
– Pn²
= [On – Pn ] . [On + Pn ]
= OC . OP
Figura 7
Figura
8
(ver relatório
da
construção pdf)
Suponhamos agora que, em vez de colarmos as barras
longas, optámos por colar as barras curtas. Obtemos então
a articulação plana da figura 9; e se o pivot onde as
barras curtas se encontram for fixo, e um dos outros pivots soltos for
obrigado a mover-se no círculo da figura 6, recorrendo à
barra extra, o outro vai descrever,
não a linha recta PM, mas a linha recta P’M’. Nesta forma, que
é muito compacta, o movimento foi aplicado com sucesso nos
ventiladores das Casas do Parlamento. A mobilidade e a ausência
de fricção e barulho são notáveis. Os
motores foram construídos, adaptando-lhes o aparelho de
“Peaucellier”, por Mr. Prim, o engenheiro das Casas do Parlamento.
Figura
10
(ver relatório
da
construção pdf)
Desta vez, em vez de colarmos as barras de uma figura na outra, na figura 10 juntámos as barras mais curtas de cada figura, interligando as extremidades. Então, como nos casos anteriores, se fixarmos o pivot, no ponto onde as barras são unidas, obtém-se uma célula que pode ser usada, pela utilização de uma barra extra, para descrever uma linha recta. Um modelo usando este tipo de célula está a ser exibido na Loan Collection na Conservatória de Artes e Profissões de Paris, e é de uma mão-de-obra exclusiva; o marcador parece nadar ao longo da linha recta.
A descoberta de M. Peaucellier foi introduzida em Inglaterra pelo Prof. Sylvester, numa palestra que ele deu na Royal Institution, em Janeiro de 1874 (5), que suscitou muito interesse e marcou o início do interesse pelo estudo das articulações planas neste país.
Em Agosto do mesmo ano, Mr. Hart, da Academia de Woolwich, leu um trabalho no encontro da Associação Britânica (6), no qual ele mostrava que a célula de M. Peaucellier podia ser substituída por um aparelho contendo apenas quatro barras em vez de seis.
Mr. Hart descobriu que se pegarmos num paralelogramo, no qual os lados
adjacentes são diferentes e se cruzarmos as barras para formar
um chamado contra-paralelogramo, representado na figura 12, e se depois
tomarmos quatro pontos, nas quatro barras, dividindo as
distâncias entre
os pivots na mesma razão, então esses quatro pontos
têm exactamente as mesmas propriedades que os quatros pontos da
célula dupla.
Figura 12
(ver relatório
da
construção pdf)
Que os quatro pontos são sempre colineares pode ser visto da seguinte forma: consideremos o triângulo abd; como aO : Ob = aP : Pd, concluímos que OP é paralela a bd e a distância entre essas paralelas está para a altura do triângulo abd assim como Ob está para ab; o mesmo argumento aplica-se à linha recta CO’, como ab : Ob = cd : O’d e as alturas dos triângulos abd e cbd, são claramente as mesmas, as distâncias de OP e O’C a bd são as mesmas, e OCPO’ situam-se sobre a mesma linha recta.
Que o produto OC.OP é constante, resulta imediatamente do facto de que ObC é metade de uma “Ponta de lança” e OaP é metade de um “Rombóide”; analogamente se mostra que O’P.O’C é constante, e do mesmo modo, também o são OC.CO’ e OP.PO’. Usando então a célula de Hart assim como usámos a de Peaucellier, obtemos um movimento rectilíneo com um mecanismo de cinco barras. Um modelo destes foi exibido na Loan Collection por M. Breguet.
Queremos agora chamar a atenção para uma extensão do aparelho do Mr. Hart, que foi descoberto simultaneamente pelo Prof. Sylvester e por A. Kempe. No aparelho de Mr. Hart estávamos apenas preocupados com barras e pontos nessas barras, mas no aparelho, que queremos agora descrever, temos peças em vez de barras. Acho que talvez seja mais interessante começar por contar a história do aparelho, especialmente porque isso permitirá mostrar outra articulação plana também muito distinta e importante – a que foi descoberta pelo Prof. Sylvester.
Seja P um ponto da barra CA; se traçarmos uma semi-recta com origem em C que passe por P e a intersectarmos com a recta que contém EA, obtemos P'. Quando fazemos o mecanismo mover-se, verifica-se que CP':CP=CD:CE=k, com k constante. Assim a curva descrita por P' é exactamente a mesma que a descrita por P', embora a descrita por P' esteja para a descrita por P na razão k.
Assim se retirarmos as barras CD e DA, obteremos uma articulação de três barras descrevendo exatamente as mesmas curvas só que com diferentes magnitudes, como descreveu o primeiro conjunto de três barras, e este novo conjunto de três barras é semelhante ao anterior com a articulação radial CD e a articulação transversal DA trocadas entre si (7).
Ao comunicar este resultado ao Professor Sylvester, este viu imediatamente que esta propriedade não se verifica apenas no caso particular do ponto P sobre a barra AD, no caso do movimento “três-barras”, mas era constituído pelo movimento de três peças, o mecanismo “três-barras” e dois triângulos rígidos.
Na figura 14, CDAB é um movimento “três-barras”, como na figura 13, mas agora P não se encontra na barra AD, P é o vértice de um triângulo rígido cujo um dos lados coincide com a barra AD. Agora, tal como antes, junte a barra CE e a barra AE, de tal modo que CE=AD e EA=CD. Juntemos agora o triângulo AEP', fazendo com que o triângulo AEP' seja semelhante ao triângulo PDA ou seja, tal que os ângulos AEP' e ADP sejam iguais, e P'E:EA=AD:DP.
Figura 14
(ver relatório
da construção pdf)
É fácil compreender a partir daqui que PC':PC=k e que o ângulo PCP' é constante; desta maneira o lugar geométrico descrito pelos pontos P e P' são semelhantes, só que têm tamanhos diferentes, e um é rodada através de um ângulo e o outro através de outro.
Agora vamos observar que as duas demonstrações são inteiramente independentes da barra AB, que apenas afeta a curva particular descrita por P e P'. Se nos livrarmos de AB em ambos os casos, vamos obter na primeira figura o comum Pantógrafo e na segunda uma bonita extensão do mesmo, chamada pelo Professor Sylvester, o seu inventor, de Plagiógrafo ou “Skew” Pantógrafo. Tal como o Pantógrafo, o Plagiógrafo irá aumentar ou reduzir as figuras e rodá-las através de qualquer ângulo, escolhendo a posição certa de P e P. Podemos tomar qualquer valor para a razão CP':CP, assim como o ângulo PCP' pode ser construído para obtermos qualquer valor pedido. Se o ângulo PCP' é igual a 0º ou a 180º, vamos ter as duas formas do Pantógrafo no seu uso comum; se ele for construído de modo a assumir sucessivamente valor diferente dos referidos anteriormente, podemos a partir de P, repetindo o mesmo processo, obter P', rodando-o em torno do centro fixo C após a forma de um caleidoscópio. Conseguimos perceber através disto que o instrumento (que nunca foi praticamente construído) merece ser posto nas mãos do autor do projecto. Apresentamos aqui a figura de um pequeno modelo de uma forma possível para o instrumento, fornecido por Kempe à Loan Collection a pedido do Professor Sylvester (8).
Depois desta descoberta do Professor
Sylvester, ocorreu em simultâneo ao professor e a Kempe (que
comunicavam
um ao outro as suas descobertas por correio) que o princípio do
Plagiógrafo pode ser
alargado ao Contra-paralelogramo
do senhor Hart; é
esta descoberta
que vamos passar a explicar. Kempe aborda este assunto de um modo
diferente
daquele que descobriu, para conseguir explicar melhor.
Figura 15
Se pegarmos no Contra-paralelogramo do Sr. Hart e dobrarmos as articulações nos quatro pontos que estão sobre a mesma recta, através do mesmo ângulo, estes passarão a encontrar-se nos vértices de um paralelogramo de ângulos e área constantes, para que o produto dos dois lados adjacentes seja constante.
Na
figura 16 os pontos estão sobre
os vértices
de um rectângulo. Os furos são tirados no meio das
articulações,
e a dobra fica em forma de ângulo recto.
Figura
16
Os quatro furos OPO'C estão sobre os quatro vértices de um rectângulo, e o produto de quaisquer dois lados adjacentes, como no exemplo OC'OP, é constante. Segue-se que se O for rodado até ao ponto fixo O', como se vê na figura 6, e C for rodado até à extremidade da articulação, P descreverá uma linha recta inclinada para PM num ângulo semelhante ao das articulações das barras, isto é, um ângulo recta.
Não
posso abandonar o estudo deste aparelho, ao qual meu nome está
associado juntamente ao do Professor Sylvester, sem expressar a minha
gratidão pelo seu interesse, que ajudou nas minhas
investigações, e meu pesar pela sua partida para a
América para ser Professor
na nova Johns Hopkins University, o que me privou de valiosas
sugestões e cujo encorajamento me ajudou tanto nas minhas
investigações.
Antes de terminar o estudo da
célula de Peaucellier e suas modificações, queria
apenas indicar outra propriedade importante que possui, para
além daquela que permite construir o movimento rectilíneo
exacto.
Vamos
agora estudar mecanismos articulados seguindo a leitura do Professor
Sylvester, o qual já foi referido.
A propriedade importante deste sistema articulado é que, embora possamos movimentar as barras, fazendo com que os pontos P e P’ se aproximem ou se afastem um do outro, a linha imaginária que une P a P’ é sempre perpendicular à barra que une os pivots ou seja LM. Se um dos pontos P ou P’ for fixo, e a ligação LM se mova de modo a manter-se sempre paralela a uma linha fixa independentemente do movimento, o outro ponto descreverá uma recta perpendicular a essa linha fixa. A Fig.19 mostra o movimento descrito fixando P’. Não é necessário explicar como o paralelismo de LM é preservado adicionando a ligação SL, fica claro recorrendo à figura. A linha recta que é descrita pelo ponto P é perpendicular à recta que une os dois pivots fixos; podemos contudo, sem aumentarmos o número de barras, construir um ponto no mecanismo, que descreva uma linha recta que faz um ângulo definido
com
SP
ou, podemos pela substituição da ligação PC
por uma peça plana, obter um número de pontos qualquer,
movendo-se em qualquer direcção. Na Fig.20, para
simplificar, apenas se mostram a barra CP’ e a nossa peça que
substitui a ligação PC. A nova peça é
circular
e tem buracos por toda a peça à mesma distância de
C em que PC = PC’. Agora vemos pela Fig.19 que P se move numa linha
recta
vertical, em que PC na Fig.20 é a mesma que na Fig.19; mas por
uma
propriedade da circunferência muito conhecida, se H for qualquer
um dos buracos na peça, o ângulo HP’P é constante,
assim a linha recta HP’ está fixa, e H move-se nessa linha; de
igual
modo todos os outros buracos movem-se ao longo de linhas rectas que
passam
no ponto fixo P’, e obtemos um movimento numa linha recta em todas as
direcções.
Figura
20
(ver relatório da
construção pdf)
pretendêssemos movimento numa só direcção, poderíamos retirar todo o disco excepto a porção que forma a barra contendo C, P e o ponto que se move na direcção pretendida.
O
rombóide duplo
da Fig.18 pode ser utilizado para produzir outros mecanismos
articulados de utilidade. Por vezes, é necessário ter,
não só um ponto, mas uma estrutura inteira em que todos
os pontos se movam em linha recta. Como exemplos temos o escorrega
apoiado num torno mecânico,
as tábuas transversais, “marteladores”(punches), perfuradores,
pontes levadiças, etc.. O rombóide duplo permite-nos
produzir mecanismos articulados com essas propriedades. No mecanismo articulado da Fig.21 (construção que
compreenderemos logo que se entenda o funcionamento do rombóide duplo), a barra horizontal move-se para a frente e para trás como que se deslizasse num eixo horizontal fixo. Este mecanismo poderia ser eventualmente útil na construção de uma viga mestra duma ponte levadiça.
No mecanismo articulado da Fig.22, que é outra combinação de dois rombóides duplos, a barra vertical move-se de tal forma que todos os pontos descrevem linhas rectas horizontais.
Existe uma modificação deste mecanismo articulado que será, na minha opinião, interessante. No sistema articulado da Fig.23, na qual, se as barras a fino fossem retiradas, seria o esboço da Fig.22, retiremos os segmentos de recta a tracejado e acrescentemos os segmentos de recta finos;
Obtemos então um sistema articulado com as mesmas propriedades do mecanismo articulado da Fig.22, mas visto na sua nova forma como sendo a régua das paralelas duplas (ordinary double parallel ruler) com três barras adicionadas. A Fig.24 é uma régua de paralelas duplas (double parallel ruler) construído numa placa com uma leve modificação. Se a régua de baixo for fixa horizontalmente a de cima mover-se-á verticalmente para cima e para baixo na placa, não efectuando movimento lateral.
Enquanto
estou com este tipo de movimento,
posso descrever um trabalho exibido na Loan Collection pelo Professor
Tchebicheff,
não varia de comprimento, logo poder-se-ia pôr uma barra no seu lugar) é uma combinação de dois movimentos paralelos do Professor Tchebicheff dados na Fig.4, com a inserção de algumas barras para manter o assento paralelo com a sua base. O desvio da superfície plana superior de um movimento completamente horizontal é por isso dupla do traçado do movimento paralelo simples.
A Fig.26 mostra como poderá ser produzido um aparelho similar, de construção muito mais simples, usando aproximações do movimento paralelo de Tchebicheff. Os comprimentos das barras que formam o movimento paralelo foram dados anteriormente (Fig.4). A distância entre pivots no assento móvel é metade da distância
entre os pivots fixos, e o comprimento da barra restante é metade do comprimento das barras radiais.
Um movimento exacto do mesmo
tipo é apresentado na Fig.27. O,
C, O', P são os quatro focos dum
quadrilátero apresentado na figura, na qual as barras são
dobradas em ângulo recto, de tal maneira que OC.OP
é constante, e CÔP
é um angulo recto. O foco O
é articulado sobre um ponto fixo, e
C é construído
de modo a que a
barra QC se mova num
círculo de centro Q e
raio QC=OQ. Consequentemente
P move-se numa linha paralela a OQ. As cinco peças móveis
descritas
constituem o movimento paralelo de Sylvester-Kempe. A isto
acrescentamos
o banco móvel e a restante barra RO’. As distâncias aos
pivots,
PR e RO’, são tais que PR=RO’=OQ. Assim o banco permanece sempre
paralelo
a QO, e P move-se exactamente numa linha recta horizontal, tal como
qualquer
ponto nesta linha.
Figura
32
(ver relatório da
construção pdf)
postulado de Euclides sobre articulações planas, permite-nos resolver um problema sem solução “geométrica”. Posso obviamente
Figura
33
(ver relatório da
construção pdf)
continuar a extender a articulação plana obtendo outras que dividam um ângulo em quantas partes queiramos. É obvio que estas articulações planas podem também ser utilizadas como ferramentas para duplicar, triplicar, etc, velocidades angulares (12).
Outra versão do”Isoklinostat” - denominado pelo professor Sylvester - foi descoberta por ele. Esta articulação tem a grande vantagem de ser constituída por muitos braços tendo apenas duas distâncias pivot sem qualquer proporção entre elas, mas tem mais braços que o outro, e como a abertura dos braços é limitada, não pode ser utilizada como multiplicador de ângulos.
Depois da publicação do artigo contendo uma lista dos trabalhos dos quais temos estado a falar, fizemos notar noutro artigo, perante a “Royal Society” (13), que os movimentos paralelos, bem como os de M. Peaucellier e Mr.Hart, são todos casos particulares de mecanismos articulados gerais que dependem do uso de uma articulação plana composta por duas figuras similares. Dado o carácter puramente matemático desta questão, o assunto não será convidativo a uma abordagem mais profunda, pelo que o deixamos em aberto para quem nele estiver interessado.
Pensamos que o problema da construção de uma linha recta com mecanismos articulados fica por aqui, e não queremos ir muito longe com a parte teórica por razões de ordem prática. Os resultados obtidos deverão interessar mais a um mecânico, caso tenham algum valor práctico. Mostramo-vos como conseguimos desenhar uma linha recta, problema que nos levou a investigar alguns tipos importantes de articulações. Com isto esperamos provar-vos o quão importante e interessante é este novo campo de investigação. Há de facto neste livro muitos factos que não foram provados (14); desafiamos o leitor a investigar o assunto, podendo assim fazer novas descobertas, uma vez que as áreas inexploradas neste assunto são ainda muitas. Não considere o assunto acabado com a leitura do nosso livro.